Não vale a pena tentar fazer mistérios com a autora que escolhi para este mês do Natal. Foi tão óbvia a escolha, para mim, que não me ocorreu mais ninguém. É a minha preferida? Podem perguntar. Talvez, talvez seja. Sei que é a mais terna, aquela que mais procurou a justiça e a perfeição e isso, na minha opinião, é impagável (como ela foi sempre).
Sophia é Sophia, e quando ela falava (ou escrevia) o mundo não podia fazer mais do que ficar em silêncio para a ouvir.
Porque
Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.
in Mar Novo (1958)
4 comentários:
Olha,Susana! O primer livro que eu li em português foi de esta autora (Contos exemplares).Linda.
Há nela uma sensibilidade, que só pode ser apreciada pela leitura da sua obra poética, profundamente marcada por valores como a justiça e A VERDADE, que é sem dúvida, o tema deste poema.
Pois é. Tambén vou ficar caladinha.Tão rotunda.
Lola!!!! Que bom tê-la por aqui! Normalmente começa-se por Sophia, mas pelos contos para crianças, não pelos contos difíceis.
A sensibilidade e o desejo de justiça e perfeição são também o que me atrai, Encarna, este poema foi um dos elementos centrais de um exame de literatura que eu fiz na Escola Secundária. Ainda me lembro do pânico e do mistério que se foi desvendando enquanto percebia que aquele "tu" era um "eu", que aquela profundidade e rotundidade moral eram reais, e que tudo era maravilhoso se contado por esta autora.
Pois é, Elvira, quando leio Sophia, costuma acontecer-me isso. E a obra poética dela é um dos meus livros de cabeceira. Daqueles a que volto uma e outra vez.
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